Não é como se eu fosse necessariamente uma pessoa séria em tempo integral.
Não, não é bem isso.
É bem mais uma ironia sórdida e muito mais divertida do que a completa seriedade.
Ainda que sempre tenda para uma expressão mais fechada, é evidente que não consigo passar cem por cento do meu tempo com a cara amarrada; na verdade, é bem menos do que isso, apesar de que a maioria das pessoas que me conhecem acreditam que eu tenha dificuldade em esboçar um sorriso. Oh, céus, que engano! Senhor, perdoai-vos! Eles não sabem o que dizem!
Os mais chegados já têm uma visão um tanto distinta da minha pessoa. Em suma, pode-se dar essa visão por meio de um questionamento que me é feito por eles diariamente: "Como uma só pessoa é capaz de falar tanta abobrinha?" Não necessariamente nessa ordem de pergunta e não necessariamente com tanta educação. A educação é o que menos temos, convenhamos!
As pessoas de humor mais obscuro tendem a fazer as outras rirem mais do que o simples humor de televisão e acho que é esse que mais me atrai. Nunca foi algo que desejei para a minha vida; o humor obscuro vem entranhado no seu DNA, como um vírus que se replica e se acopla ao seu genoma. Que coisa tão bela! Um HIV do humor!
Um dos piores comentários que já fiz aqui, quiçá nesta vida; mas não se acostumem;nem toda piada é tão ruim que não possa ficar pior.
Existe uma graça maior na maldade, devo dizer, e faz a barriga doer muito mais. Quando se mistura maldade com idiotice, então, é como agitar uma garrafa de coca-cola e soltar a tampa na cara dos amigos.
É interessante ouvir "Nossa, como você é engraçada!"..... Bem, antes palhaça do que sem graça.
~~*~~
Cancelamento
Contos de Lulu - I
- Atendimento TIM, Julienne, bom dia!
- Olá, Julienne. Bom dia! Eu gostaria de cancelar a minha
assinatura, por gentileza.
- Perfeitamente, senhor.
Qual o seu CPF?
Por um instante, houve uma pausa daquela voz masculina,
seguida de certa hesitação.
- ... CPF?
- Sim, CPF.
- Mas como assim?
- Como assim o que?
- Meu CPF.
- CPF.
- Que CPF?
- O seu, senhor. O seu CPF. O senhor é o titular da
conta?
- Sim, querida, quem mais?
- Então, senhor, preciso do seu CPF.
- Que CPF?
E foi a vez da jovem ficar calada, respirar
profundamente, ao passo que repensava na sua estratégia para com o cliente.
- ... Senhor... Façamos diferente, então; me fale o seu
nome completo.
- Lúcifer.
- Lúcifer?
- Sim, Lúcifer.
- ... Certo. Lúcifer de que?
- O que?
- Sobrenome, senhor.
- Lúcifer.
- Não, senhor. Sobrenome; depois do Lúcifer tem de ter
algo mais.
- Mas não tem.
- Senhor, não é possível que o senhor tenha uma conta “resistrada”
sem um nome completo.
- Filha, quantos Lúcifer’s existem nesse mundo?! – E
houve uma breve exaltação de sua voz.
- A questão não é essa, senhor; é lógica, apenas. Todos
têm sobrenome.
Ele bufou, passando os dedos finos na testa. A paciência
era uma virtude e, apesar de muito não ter dela, colocou a força de vontade
para funcionar e se pronunciou.
- Ok. Que seja. Ahn... – Cerrou os olhos e procurou o que
poderia dizer àquela tão inferior criatura que a fizesse simplesmente resolver
o seu problema.. - ... Satã.
- Senhor... isso não é sobrenome. – Disse ela com
descaso.
- Por que não? – Perguntou com perplexidade na voz.
- Porque não é.
- Por que não posso ter Satã no meu sobrenome?
- Mas é esse o seu sobrenome?
- ... Não. – A voz saiu em um tom baixo.
- Então, não, senhor; não pode ser Satã.
- ... Mas e se for?
- Mas é...?
- Ahn... Não.
- Então, não, senhor! – Agora a atendente quem havia sido
mais incisiva.
- Mas...
- Vamos tentar de outra forma. – Colocou-se calada e se
pôs a dedilhar o teclado do computador, o que, claramente, era possível ouvir
do outro lado da linha. – Veja bem, por sorte, o senhor é o único Lúcifer da
lista.
- E por que você não procurou antes?
- Porque poderia aparecer um monte.
- Mas não apareceu, apareceu?
- Não.
- Então, você poderia ter procurado, não poderia?
- Poderia.
- E por que não procurou?
- Senhor... – Tentou ela apartar a discussão calorosa.
- Porque se tivesse procurado, jovem, as coisas teriam
sido mais rápidas. Você acha que eu tenho tempo de ficar conversando com você
no telefone?
- Senhor...
- Sabe, eu trabalho MUITO arduamente. Tenho o que fazer!
Você é uma atendente, eu tenho de assessorar uma empresa inteira!
- Então, é uma linha com CNPJ?
- Oi?
- Não, senhor, é TIM.
- Eu sei que é TIM! – Exaltou-se.
- Então, por que falou Oi?!
Respirou ele profundamente, passando a mão na testa.
Diminuindo a voz, uma vez mais tentou manter a calma.
- Vamos passar essa questão, certo?
- Certo, senhor. Qual seria o número da sua empresa?
- Ah, mas agora, sim, estamos conversando! – Respondeu de
forma animado. – O número é 66639992369.
- Oh, pois, viu? – Disse ela com o mesmo tom de voz. –
Agora, sim! Esse é o seu CNPJ!
- OI?!
- Não, senhor! É TIM! Eu já disse.
E ele respirou profundamente, afastando o telefone do
ouvido e dando com o mesmo na testa. Era impressionante!
Com um sorriso sarcástico, tornou com o telefone ao
ouvido.
- Ok... Que seja. E agora?
- Então, agora, senhor, o que posso fazer para ajudar? –
Voz feliz.
- Eu quero cancelar a minha conta! – Como de costume,
exaltou-se.
- Mas por quê?
- Porque sim!
- Mas por quê?
- Porque eu quero!
- Isso não é resposta, senhor; não posso considerar isso
como resposta para o sistema. – Falou calmamente a atendente.
- Essa porcaria não funciona aqui embaixo, filha. É isso.
- Embaixo aonde?
- Aqui embaixo!
- Embaixo aonde?!
Difícil; muito difícil.
- ... Na empresa.
- Ah, certo. Mas não pega em nenhum lugar dela?
- Não.
- E a internet?
- Não fiz pacote com internet.
- O senhor gostaria de fazer um pacote com internet?
Serão, apenas, 130 reais adicionais para toda a sua rede! Afinal, como posso
ver, o seu CNPJ comporta bilhões de funcionários e essa será uma quantia
irrisória para o senhor. – Novamente a voz feliz.
- Gracinha de Jesus, eu não quero pacote novo nenhum. Só
quero cancelar.
- Mas por quê?
- Porque não funciona!
- Mas quem disse?
- EU DISSE!
- O senhor tem usado? Posso ver aqui que a quantidade de
ligações tem sido quase zero, senhor, e considerando a montante da sua empresa...
- É CLARO que os valores estão quase em zero, porque não
pega aqui embaixo!
- Embaixo aonde?!
Ele respira profundamente, olhando para os céus, quase
com lágrimas nos olhos. Os lábios se apertaram e o choro parecia iminente com
tamanha criatura abestalhada do outro lado da linha.
- Pai, me ajude... – Disse, em prece. De fato ele estava
pagando seus pecados.
- Oh, o senhor gostaria que seu pai entrasse como
colaborador nas despesas de sua empresa? – Barulho de teclado.
- Não! – Respondeu prontamente.
- Então, o que o senhor quer?
-
Cancelar! CANCELAR! CAN-CE-LAR!
- Ok, ok! Já entendi! Não precisa gritar!
- ...
- Senhor, estou vendo aqui que a sua última fatura está
em aberto.
- O que significa isso?
- Significa que o senhor não pagou a conta do último mês.
- Claro que não, porque eu não tive serviço. Não paguei.
- Mas tem de pagar.
- Não vou pagar por um serviço que não foi prestado!
- Então, a conta não será cancelada.
- Por que não?
- Porque a fatura está em aberto.
- E daí?
- Ela tem de ser paga.
- Por quê?
- Porque é ordem da chefia, senhor.
- Por quê?!
- Porque o dono da TIM me mandou falar isso!
- Coloca esse palhaço na linha, que quero falar com ele
AGORA!
- Mas ele não está aqui, senhor!
- Isso não é problema meu! Resolvo essa pendenga em dois!
- Dois o que?
- Segundos, garota! Segundos!
Silêncio.
- Senhor...?
- Pois não?
- Preciso que o senhor pague a última fatura para que eu
possa dar prosseguimento com a sua solicitação.
- Mas por quê?! – Ele quase chorava. Era quase tão
desesperadora, a sua súplica, quanto seria uma minhoca suplicando para ser
salva de uma frigideira.
- Porque Papai do Céu assim quis, senhor!
- Você não meta os pais dos outros na conversa, ouviu
bem?! Sem educação!
E se calaram os dois, uma vez mais.
- ... Senhor, podemos parar com isso? – Disse ela com sua
voz calma.
- Podemos. – Respondeu ele do mesmo modo, respirando
profundamente.
- Então?
- Então o que?
- O senhor vai pagar...?
- Que seja! Eu pago! Vou pagar essa merda dessa fatura,
mas resolva o meu problema!
- Certo, senhor, e eu “vou estar deixando” a sua
solicitação em aberto.
- Como assim?
- Só posso cancelar quando o senhor pagar.
- Mas eu quero cancelar agora! – E tornou a se exaltar.
- Isso não é possível, senhor; só seria possível se eu
puder debitar o valor da sua conta, com o número da mesma. Se o senhor tivesse
colocado a sua fatura para ser paga no débito automático desde o começo do plano,
essa situação poderia ser muito mais simples.
- Dane-se agora! Quer o número do cartão?
- Não, senhor.
- Como não? Você não disse que poderia debitar da minha
conta?
- Não, senhor, não foi o que eu disse.
- E o que você disse?!
- Não o que o senhor disse.
- Mas o que foi que você disse, então?
- Que só seria possível se eu pudesse, veja bem, PUDESSE,
debitar o valor da sua conta.
- E o que isso tem de diferente do que eu disse?
- O que o senhor disse foi que eu poderia, de fato,
efetivamente, realizar o débito da sua conta com o seu número de cartão de
crédito, mas isso não pode, como eu disse, ser realizado, afinal, se eu pegar o
número do seu cartão seria um crime; não posso sair por aí debitando valores da
conta dos outros, senhor, sem que isso seja registrado como débito automático
em uma conta.
- Só que isso não poderia ter sido feito no começo do
plano?
- Poderia.
- Por que não agora?!
- Porque agora não é mais o começo do plano; é o fim do
plano!
- E daí?!
- Daí o que?!
- Que é o fim do plano!
- O senhor está dizendo que é o fim do plano?!
- Sim! Eu quero cancelar! Se eu quero cancelar, então,
POR DEFINIÇÃO, é o fim do plano!
- Senhor, tenho ótimas propostas para lhe fazer! – E
retornou ao tom animado da voz. – Tem certeza de que deseja cancelar? Se o
senhor pegar o pacote de telefonia celular, internet e televisão a cabo, concorre
a uma viagem para Paris COM ACOMPANHANTE, no final do ano, e ainda ganha
entradas para a Disneyland e vale para tirar foto com o Mikey e a “Minney”!
- Filhinha, olha só... eu não estou amassando o seu pão,
estou? Não estou amassando e nem mandando você comer; só quero que você cancele
essa conta, pelo amor de Deus!
- Por favor, senhor, apelar para Deus no telefone é feio.
- É só a ele a quem consigo recorrer, meu benzinho,
porque está foda!
- Senhor, palavras de baixo “galão” não poderão ser
ditas. Essa conversa está sendo gravada.
- E eu com isso?!
- Que o senhor está sendo grosseiro comigo e não há a
menor necessidade disso.
- Não há?!
- Não, não há.
- Eu tenho cara de palhaço?!
- Depende.
- Do que?
- Do palhaço!
- Ora, sua... – Ali estava ele, preparado para falar
todos os tipos de palavrões, quando se permitiu ouvir uma risada ao fundo. –
Você está rindo?
- Oi?
- Não é “Oi”, não é? É TIM!
- Han?!
- Búrguer!
- Que?!
- Ijo!
- Para! – Reclamou ela, já desorientada.
- É você, não é, Lilith?! – Acusou, já certo de quem se
tratava.
- Eu?! – Espanto. – Digo, eu não! Não tem Lilith!
- Idiota! Pare de ficar de gracinha no telefone! Estou
tentando cancelar a TIM!
- Ainda não cancelou?!
- Não!
- Por que não?!
- Porque você fica de gracinha no telefone! Você é
estúpida?!
- Eu?!
- Não! A minha avó!
- ... Não acho que sua avó fazia gracinhas.
- Já deu, não?!
- Porque, olha só, pensa comigo... – Começou a divagar. –
Se a sua avó, que, convenhamos, você nem tem, fosse fazer esse tipo de
gracinha, requereria...
- Lilith!
- O que?!
- Sua gracinha me custou uma hora!
- Não foi isso tudo, vai...
- Foi, sim!
- E o que você quer que eu faça?!
- Pare de fazer gracinhas! Eu estou tentando cancelar
essa merda!
- Ora, mas não cancelou ainda?! Como você é lerdo!
Por fim, ele balançou a cabeça, grunhiu e gritou ao
telefone.
- ... Olha, chega, viu?! Depois a gente se acerta!
- Ok... que seja. – Respondeu ela sem se importar. – Ah,
falando nisso, aproveita que você está fazendo cancelamentos e reclamações e
liga para a NET. Caiu a rede inteira hoje de novo!
Hahahahahaha sensacional!!!! Se não pega aqui, aí embaixo que não vai pegar mesmo, Lulu!! XD
ResponderExcluirKKKK, legal o texto. Até pro capeta está difícil cancelar a linha de celular.
ResponderExcluirParabéns, Lulu!!
Não tá fácil pra ninguém! hahahaha
Excluir'' Então, o que o senhor quer?
ResponderExcluir- Cancelar! CANCELAR! CAN-CE-LAR!'
O bagulho é difícil mesmo
HUAHUAHUAHUAHUA
Ninguém consegue